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Nesta segunda-feira, 01 de julho, é comemorado o Dia Internacional do Reggae. No Brasil, há uma outra data. 11 de maio é o Dia Nacional do Reggae. Em maio ou em julho, festejemos ouvindo Bob Marley.
Não é de Marley, contudo, a primeira lembrança que tenho da Jamaica e da sua música. E sim das imagens e dos sons de Dr. No, o filme que, em 1962, inaugurou a franquia do agente 007. Ainda não é reggae o que ouvimos na aventura inicial de James Bond, são algumas das suas fontes.
Reggae mesmo, ouvi quando o single Vietnam, de Jimmy Cliff, se incorporou à minha discoteca, por volta de 1970. E já ouvira, sem saber do que se tratava, em 1968, ano em que os Beatles gravaram Ob-la-di Ob-la-da, uma versão branca do ritmo que Marley mostrou ao mundo.
A gravação dos Beatles não tem a “pegada” dos originais jamaicanos. Falta molho. Aponta, porém, para a força do fenômeno. E inaugura o que se consolidaria na década de 1970: a inequívoca adesão dos brancos à invenção dos pretos da Jamaica.
Paul Simon, Paul McCartney, os Rolling Stones, Eric Clapton, Elton John, o Led Zeppelin, Bob Dylan, o Police, Sting. Todos gravaram reggae. Numa entrevista que me deu há mais de 30 anos, Cliff fez duras críticas à versão branca do reggae, mas não custa reconhecer que os grandes nomes do pop/rock internacional ajudaram a popularizar ainda mais a música jamaicana.
Há Jimmy Cliff, há Peter Tosh, mas o melhor do reggae está em Bob Marley, nos discos que gravou durante a década de 1970. Eles sintetizam a força do ritmo que os jamaicanos ofertaram ao mundo, exercendo uma influência notável sobre muito do que foi produzido depois por negros e brancos.
Cliff pode até ter razão na crítica ao que os astros brancos do pop/rock fizeram com o reggae. Pode estar certo ao afirmar que ninguém faz tão bem quanto os pretos, que criaram e têm o domínio total da fórmula.
Mas é necessário admitir que a adesão de artistas como Eric Clapton e Bob Dylan, e bandas como os Beatles e os Rolling Stones, deu uma projeção internacional ao ritmo jamaicano que não pode ser desconsiderada.
O primeiro artista brasileiro a colocar a palavra reggae na letra de uma canção foi Caetano Veloso. Nine Out of Ten, composta e gravada no exílio londrino, está no LP Transa, de 1972. A descoberta, no entanto, não foi dele, e sim de Gilberto Gil em suas andanças pela Londres da virada dos anos 1960 para os 1970.
Mais tarde, Gil verteria para o Português No Woman No Cry, do repertório de Bob Marley, que, em 1979, nos estertores da ditadura brasileira, transformou-se num dos hinos da anistia. Foi ele que apresentou o reggae a Dominguinhos, durante a turnê Refazenda, e ouviu do sanfoneiro uma definição tão simples quanto verdadeira: “É um xotezinho safado”.
O comentário de Dominguinhos remete a uma semelhança fácil de ser constatada. E antecipa o que ocorreria muito tempo depois. No início dos anos 2000, Gil gravou dois tributos: um a Luiz Gonzaga, o outro a Bob Marley.
Um deu sequência ao outro. Mais do que isto: em algumas versões das músicas de Marley, Gil inseriu elementos da música nordestina. No ritmo, na melodia, até no uso da sanfona.
Mesmo que muitos cantem e toquem reggae no Brasil, é de Gilberto Gil o mérito de tê-lo difundido entre nós. Sua versão de No Woman No Cry acabou por incorporar-se ao seu repertório como se a canção tivesse sido escrita por ele.
“Everything’s gonna be all right” – cantava Marley nos anos 1970. Continua cantando porque não sai da nossa memória afetiva. “Tudo, tudo, tudo vai dar pé” – cantava Gil em 1979. Continua cantando.
O reggae é ritmo contagiante, irresistivelmente dançante, acrescido de letras de forte conteúdo social e político. E tem a religião, tem o uso da maconha, tem tanta coisa. Bob Marley se transformou num símbolo fortíssimo, numa imagem icônica por vezes maior do que a própria música.
A música e a imagem de Marley estão resistindo ao tempo, mais de 40 anos depois da sua morte em 11 de maio de 1981. Tinha apenas 36 anos. Ouvir Marley é a melhor maneira de festejar o Dia Internacional do Reggae.