Foto/Reprodução.
Na minha juventude, nos anos 1970, o Recife era uma cidade cheia de lojas de discos. Não todas, mas a maioria pertencia à cadeia Aky Discos, cujo dono era João da Comdil.
João expandiu seu negócio. Botou lojas em várias cidades, dentro e fora de Pernambuco, inclusive em João Pessoa. Também vendia no atacado no depósito da Comdil.
A Allegro Cantante veio depois, no início da década de 1980. Era um negócio alternativo. Um sebo de livros que o proprietário Joaquim Américo transformou em loja de discos.
Quando vieram os shoppings, já era um bom programa ir ao Recife comprar discos tanto nas lojas da Aky Discos quanto na Allegro Cantante, que ficava no bairro da Boa Vista.
Estávamos no começo dos anos 2000, com CDs ainda em evidência, quando a Livraria Cultura e a Saraiva chegaram ao Recife para, além de livros, também vender discos.
A Cultura, dos judeus Herz, de São Paulo, era um “templo” fabuloso edificado no Recife Antigo, como anexo do shopping Paço Alfândega.
A Passa Disco é de 2003. Primeiro, na Estrada do Encanamento. Depois, na Rua da Hora, a poucos metros da agitação da Avenida Agamenon Magalhães.
Passa Disco. Uma loja de discos. CD, vinil. Somente música brasileira. Muita música pernambucana. Um oásis improvável na era dos serviços de streaming.
Espaço convidativo, muito bem decorado pelas mãos do dono. Sim, o dono. O nome dele é Fábio Cabral, que se orgulha de ser primo do poeta João Cabral de Melo Neto.
Fábio vende discos e sabe tudo a respeito do produto que vende. Como se não bastasse, ainda é um notável contador de histórias.
O mercado de discos foi mudando, as lojas de João da Comdil fecharam, e, em duas décadas, Fábio fez da Passa Disco um espaço de resistência cultural dentro do Recife.
Sua loja abriu as portas para shows, sessões de autógrafos, e ele próprio, através de um selo, viabilizou edições físicas de álbuns de artistas pernambucanos.
Uns 10 dias atrás, numa conversa ao telefone com Fábio, ele me confidenciou que ia fechar a Passa Disco. Sem novos CDs no mercado, o negócio se tornara insustentável.
A ideia era ir até o final do ano. Mas, há dois dias, Fábio antecipou o fim da Passa Disco. Num comunicado, anunciou que está encerrando as atividades já agora em setembro.
Há algo de simbólico no fechamento da Passa Disco. Com a loja de Fábio, sa vai mais um pedaço de um tipo de negócio que parece viver seus estertores.
Os poucos que continuam comprando discos físicos lamentam duplamente. Por Fábio e pela Passa Disco. Ele e ela farão muita falta.