Neste fim de semana, os Estádios Almeidão e Amigão, em João Pessoa e Campina Grande, respectivamente, completam 50 anos de vida. Por coincidência do destino, o cinquentenário acontece nos mesmos dias da semana da ocasião das inaugurações: sábado e domingo. Em 1975, as praças esportivas foram inauguradas com uma coincidência ainda mais inusitada do que das suas arquiteturas. Ambos estádios tinham o mesmo nome: Ernani Sátyro, pai político das obras.
Almeidão recebeu 44 jogos oficiais na temporada 2024..
Marcos Siqueira / CBN
Mas e o estádio de João Pessoa não é conhecido como Almeidão? De onde vem o Almeida de Ernani Sátyro? Ou o nome mudou? O Jornal da Paraíba explica como se deu o processo que acabou por modificar o nome do maior estádio da capital paraibana.
Nomes iguais geraram piadas
Foi o governador Ernani Sátyro que bateu o martelo, em 1973. A Paraíba vai receber dois estádios com capacidade para mais de 40 mil pessoas para que o futebol paraibano volte a disputar a principal competição nacional, na década de 1970, o Campeonato Nacional de Clubes.
O estado estava fora do torneio mais importante do futebol profissional desde 1971, quando a Confederação Brasileira de Desportos (CBD) passou a organizar o Campeonato Brasileiro, após as extinções da Taça Brasil — competição que a Paraíba sempre teve representantes — e o Roberto Gomes Pedrosa.
Ernani Sátyro.
Reprodução
Em 1973, Ernani Sátiro resolve construir os dois estádios: um em Campina Grande e um em João Pessoa, para serem inaugurados em 1975, na última semana do seu mandato, nos dias 8 e 9 de março.
No ano seguinte, em 1974, ano em que a maior parte da obra das duas praças esportivas foi executada, rumores sobre quais seriam os nomes dos estádios começaram a surgir. A cultura de homenagear políticos era enorme. Algo que não mudou muito nos tempos atuais.
De modo que a campanha para que as praças esportivas levassem o nome do pai político delas ganhou força sobretudo junto aos correligionários de Sátyro na Assembleia Legislativa. A campanha deu resultado e o governador achou realmente de bom tom definir que os estádios realmente teriam seu nome numa auto-homenagem, o que gerou algumas repercussões na imprensa local, em jornais de Recife e na imprensa carioca, com colunistas fazendo piadas e criticando o egocentrismo do governante paraibano.
Charge do Diário de Pernambuco.
Reprodução / Diário de Pernambuco
Havia, no entanto, uma sutil diferença na nomenclatura dos estádios que iram ser inaugurados em 1975. O estádio de Campina Grande seria o Estádio Governador Ernani Sátyro, nome que carrega até os dias de hoje. Já o de João Pessoa teria o nome oficial de Ministro Ernani Sátyro.
No dia 9 de março, o estádio pessoense foi inaugurado com esse nome e com o apelido “Satyrão”. O de Campina Grande tinha e tem até hoje a alcunha de “Amigão”, em alusão ao apelido que o governador tinha, “amigo velho”, que era a forma também como ele tratava as pessoas no meio político.
Almeidão: mudança do nome em João Pessoa acontece meses depois
Em João Pessoa, o nome do estádio não foi rejeitado. Mas a aprovação da nomenclatura e da auto-homenagem do governador foi imensamente menor do que aconteceu em Campina Grande, por algumas razões.
Uma delas é que a gratidão em Campina Grande era notadamente maior. Isso porque quando acalorou o debate sobre onde poderia ser construído um primeiro grande estádio na Paraíba, a chance de haver apenas uma obra, e ela ser na capital do estado, era real.
Placa do Botafogo em homenagem à inauguração do Estádio Almeidão, inaugurado como Satyrão.
Paulo Lira
Tanto que a crônica esportiva de Campina Grande e a classe política, bem como os seus desportistas, foram cruciais em exercer uma pressão sistemática em pleitear que o estádio deveria ser na cidade e não em João Pessoa. É nesse contexto que, diferente de outros estados que receberam empreendimentos semelhantes, mas somente na Capital, a Paraíba acabou por fazer dois estádios, por decisão de Ernani Sátyro.
Além disso, havia um certo movimento político em João Pessoa de homenagear um grande desportista da cidade, que era filho de um importante político da Paraíba, o escritor e ex-governador José Américo de Almeida, que tinha forte relação com a capital paraibana, tendo sido chefe maior do Estado em 1930, como líder da Revolução de 1930 no Nordeste, e de 1954 a 1956 após ter sido eleito.
José Américo de Almeida Filho, mais conhecido no futebol como Américo Filho, havia morrido no fim do ano de 1973 em um trágico acidade automobilístico na Bahia. Américo Filho havia sido presidente do Botafogo-PB além de ter sido campeão paraibano como jogador em 1938.
Reprodução / Jornal O Norte
Filho de um proeminente político da história paraibana, Américo Filho assumiu cargos de várias empresas públicas, a exemplo da Companhia de Navegação Lloyd Brasileiro, empresa estatal, mas que tinha algumas ingerências do capital privado. Foi presidente da empresa na Paraíba.
Desportista nato, sempre esteve presente nos debates e na construção da evolução do futebol paraibano, em especial de João Pessoa. Com certa influência na política paraibana, sempre botava a modalidade nas pautas políticas. Em muitos momentos, conseguira cargos públicos para jogadores do seu clube, o Botafogo-PB, ajudando o Belo a contratar bons atletas, convencendo-os de acertar com o clube através de propostas de emprego na cidade.
Estádio Almeidão, fachada do Estádio Almeidão.
Josemi Cavalcanti
Já fora do Alvinegro, foi um dos responsáveis, por exemplo, por trazer o Vélez Sarsfield, da Argentina, na década de 1950 a disputar os dois primeiros amistosos internacionais da história do futebol local, contra Botafogo-PB e Treze.
Ainda em 1975, projetos de lei chegaram a ser apresentados na Assembleia Legislativa da Paraíba para que houvesse uma mudança no nome do estádio de João Pessoa. Como o de Campina Grande conservaria a homenagem ao governador Ernani Sátyro, apesar de lá também ter havido movimentos por mudanças, correligionários de José Américo de Almeida buscavam por vias oficiais agradar o político com a homenagem ao seu filho, tragicamente morto.
José Américo de Almeida e Ivan Bichara.
Reprodução / Jornal A União
Vale lembrar que José Américo de Almeida concordava com a homenagem e também agiu por ela, sendo um grande cabo eleitoral para que o maior estádio da Capital homenageasse o filho.
Em maio daquele ano, após um debate na Assembleia Legislativa sobre um projeto de lei apresentado pelo deputado da Arena, Edvaldo Mota, que propunha a mudança do estádio da Capital para José Américo de Almeida Filho, a casa legislativa, com grande empenho da própria bancada arenista, decide rejeitar a matéria e acompanhar o parecer do relator, deputado Egídio Madruga, que defende que deveria ficar fica a cargo do governador a modificação ou não do nome do maior estádio de João Pessoa.
O governador da Paraíba naquela altura era Ivan Bichara, que havia sucedido Ernani Sátyro uma semana depois das inaugurações dos estádios. Bichara era próximo a José Américo de Almeida e fazia coro pela mudança. É ele quem assina no dia dia 16 de junho o decreto lei que define que o novo nome do estádio de João Pessoa seria Estádio José Américo de Almeida Filho, que completa 50 anos neste domingo.