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“Navegar é preciso, viver não é preciso”

CBN Paraíba

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Imagem/Reprodução YouTube.

À altura do Tropicalismo, Maria Bethânia sugeriu que Caetano Veloso compusesse Baby. Ele compôs, e a canção está no disco ao vivo Recital na Boite Barroco, que Bethânia lançou em 1968. Mas a gravação original, e a que ficou mais famosa, é a de Gal Costa no álbum-manifesto Tropicália, também de 1968. 

Baby não foi a única sugestão que Maria Bethânia deu ao irmão compositor. De 1969, Os Argonautas surgiu de um outro pedido dela. O ponto de partida desse fado brasileiro seria o “navegar é preciso, viver não é preciso”.    

Maria Bethânia conheceu o verso lendo o poeta português Fernando Pessoa, mas Pessoa foi buscar o “navegar é preciso, viver não é preciso” na antiguidade, na história dos argonautas que é narrada pela mitologia grega. 

Os Argonautas, o belíssimo fado de Caetano Veloso, foi originalmemnte gravado em 1969, na época em que o compositor estava confinado em Salvador, depois de ter sido preso pela ditadura militar e antes do exílio em Londres. 

No registro original, Caetano canta, e Gilberto Gil o acompanha ao violão. A gravação foi finalizada mais tarde por Rogério Duprat, o maestro dos tropicalistas, e está no álbum de capa branca de Caetano Veloso, lançado quando ele já estava no exílio. 

Os Argonautas é da mesma safra de Atrás do Trio Elétrico, Não Identificado, Irene e Marinheiro Só. Todas elas estão no disco branco de 1969. 

Maria Bethânia gravou Os Argonautas ao vivo em 1971 e voltou a gravar, muito lá na frente, no álbum Piratas, de 2006. Elis Regina também gravou. O registro está em Ela, de 1971, o segundo dos dois discos de Elis produzidos por Nelson Motta.   

Caetano Veloso voltou a Os Argonautas em 1972. A música fecha o LP Caetano e Chico Juntos e ao Vivo. O bom nessa gravação é o luxuosíssimo auxílio vocal do grupo MPB-4, que, à época, trabalhava com Chico Buarque em estúdios e palcos.

Quando Caetano Veloso compôs Os Argonautas, e no tempo dessas gravações a que me refiro, a cantora portuguesa Carminho nem era nascida. Maria do Carmo de Carvalho Rebelo de Andrade, que adotou o nome artístico de Carminho, veio ao mundo em Lisboa em agosto de 1984 e agora tem, portanto, 40 anos. 

Carminho canta fado, mas ela não é exatamente uma fadista. Há muitas outras coisas em seu repertório. Uma delas, a música brasileira. Desse seu vínculo com o Brasil, destaco o álbum Carminho Canta Tom Jobim, lançado em 2016. Ela também está no segundo álbum dos Tribalistas, de 2017. 

Caetano Veloso e Carminho gravaram um dueto em 2021. Você-Você, de autoria de Caetano, aparece no álbum Meu Coco, que o artista fez durante a pandemia. Enriquece o registro um vídeo em que Caetano e Carminho conversam sobre Brasil e Portugal.  

Agora em 2024, Caetano e Carminho voltaram a se encontrar num single que acabou de ser lançado nas plataformas digitais. O single traz Os Argonautas numa gravação feita por esta grande cantora portuguesa. 

Carminho canta Os Argonautas como uma fadista. Caetano Veloso entra com um sotaque que mistura o português do Brasil com o português de Portugal.   

“O barco, meu coração não aguenta/Tanta tormenta, alegria/Meu coração não contenta/O dia, o marco, meu coração/O porto, não”.

“O barco, noite no céu tão bonito/Sorriso solto perdido/Horizonte, madrugada/O riso, o arco, da madrugada/O porto, nada”. 

“O barco, o automóvel brilhante/O trilho solto, o barulho/Do meu dente em tua veia/O sangue, o charco, barulho lento/O porto, silêncio”.

E vem o refrão: “Navegar é preciso/Viver não é preciso/Navegar é preciso/Viver não é preciso”. No final, apenas o “viver”. E as reticências.

Aos 26 anos, quando compôs Os Argonautas, Caetano Veloso já era um gigante. 55 anos depois, a gravação de Os Argonautas por uma cantora portuguesa como Carminho estende – ou completa – a história desse extraordinário fado brasileiro. 

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